Monday, September 10, 2012

Choro-te

Nunca esquecerei a vontade que tinhas de te vencer. O teu olhar esperançado em lutar, como sempre fizeras, e acreditavas conseguir fazer. O teu olhar esperançado quando no regresso a casa te diziam estar tudo bem, por mais uns tempos. E aí, vivias mais uns dias como dias fantásticos, no entretém da rotina prazeirenta.
Para ti, cada ida ao hospital, e regresso, com ou sem nova medicação, eram mais uma oportunidade para nos veres, para sorrires e apreciares a paz, simples, que tanto gostavas.
Para nós, cada ida tua ao hospital, era mais uma procura de esperança que pudesses continuar a gozar tudo isso, e nós a gozar de ti presente.
Nunca esquecerei os teus sonhos connosco, em que sabias precisarmos de ti e sentias a possibilidade fatídica de vires a não estar, mas dizia-te ser normal. Era da medicação, mas ia passar. E quando chegasses a casa, ias voltar ao gozo da tua paz interior. Sim, interior, inabalável. No dia dos teus sonhos, deitado naquela falsa cama, vi-te chorar. Pela primeira e última vez em toda a minha vida, vi-te chorar. Foi a tua derradeira forma de me dizeres que nos amavas e amarias sempre, e que, não, não nos querias deixar. Ao ver-te chorar, fiz o que melhor sei. Disse-te que tudo iriamos superar, e continuei a tratar de receituários e prescrições esperançadas com a médica em quem tudo depositavas enquanto desejo de continuar connosco. Tu choravas, eu não. Nem presente, nem ausente. Tenho pálpebras sensíveis, que incham quando choro, e tu irias saber. Saberes que chorei seria o mesmo que saberes que a esperança terminara, e eu não queria nunca que ela terminasse. Não para ti. Eu estava consciente, mas achei que não terias maior dor do que ver dor em mim, e ver que a minha esperança morrera, por isso, não queria nunca matar a tua.
Nos teus olhos via esperança, sempre esperança. Nos meus, vias muita vontade de continuar a ter esperança, e procuravas isso. Até as portas do hospital dizerem já não ser bem-vinda.
Hoje, quando entro em casa, vejo-te no alpendre a sorrir por me veres, e a perguntares como estou. Eu dizia sempre que estava bem, e continuo a dizer, para não te preocupares. Vejo-te a sorrir, com energia, porque tudo estava bem, e porque tinhas o que precisavas. Um trabalho duro, que te garantia o nosso sustento. Um pagamento a horas, as contas pagas e a nossa saúde assegurada. Estavas bem e de nada mais precisavas. Vejo-te no sofá a gozar os clubes e a olhar os políticos com a distância de quem não partilha o mesmo universo. Vou ao teu armário e cheiro as tuas roupas na esperança de que ainda cheirem a ti, mas, quanto mais lá vou, menos cheiram. Vejo a tua falsa presença em toda a casa… aquela que não nos permite rir, apenas nos permite aguentar como gente grande as fatalidades da vida, como tu nos ensinaste a fazer. Mas não há o teu riso. Choro-te e chorar-te-ei para sempre. Agora não vês as minhas pálpebras, e quando te choro, sonho contigo.

Os meus 3 C's... Chopin, chocolate e chianti...